A rica herança cultural e religiosa de Salvador ganha um novo olhar com o projeto “Salvador Islâmica”, idealizado pelo museólogo Eldon Neves. O roteiro turístico-cultural destaca o legado dos Malês, africanos muçulmanos que, escravizados no Brasil, se organizaram em torno do islamismo como símbolo de resistência, culminando na histórica Revolta dos Malês de 1835. Mais do que um passeio pela cidade, a iniciativa oferece uma imersão na cultura afro-islâmica, abordando temas como liberdade religiosa, identidade cultural e luta antirracista.
Inspirado por suas próprias raízes afro-islâmicas, reveladas por um teste de DNA, Eldon Neves idealizou o roteiro como forma de ampliar o acesso a uma história frequentemente negligenciada.
Quero que o roteiro seja uma experiência transformadora, que leve baianos e visitantes a enxergarem a cidade por um ângulo diferente. Essa é uma história que não está nos livros escolares, mas que é fundamental para compreender Salvador e sua pluralidade cultural.
Eldon Neves
Museólogo
O sociólogo e professor Fábio Nogueira, autor de Malês 1835: Negra Utopia, destaca que o islamismo desempenhou um papel crucial na organização social e na luta por liberdade dos Malês. “O islamismo era mais que uma religião para os Malês, era uma fonte de força e resistência. Esses africanos muçulmanos, originários de regiões como a Nigéria e o Mali, trouxeram para Salvador uma cosmovisão que dialogava com o direito à liberdade, à dignidade e à resistência contra a opressão“, explica.
Pontos do roteiro
O percurso reúne locais emblemáticos da resistência afro-islâmica em Salvador, como:
Sociedade Protetora dos Desvalidos: fundada em 1832, é considerada a primeira sociedade beneficente negra do Brasil.
Ladeira da Praça: onde a Revolta dos Malês teve início.
Centro Cultural Islâmico de Nazaré: referência do islamismo contemporâneo na Bahia.
Igreja da Santíssima Trindade, em Água de Meninos: palco de confrontos históricos.
Itapuã: cenário da Revolta dos Haussás, um marco precursor da insurreição de 1835.

Além de sua importância histórica, o islamismo deixou marcas profundas na cultura de Salvador. Entre elas, o uso de vestes brancas, uma prática islâmica que se fundiu com as tradições do candomblé e outras crenças afro-brasileiras. Nogueira afirma que os Malês trouxeram uma visão de mundo que associava liberdade à dignidade e resistência, e isso se reflete na identidade cultural da Bahia até hoje.
Turismo com propósito educativo
Eldon Neves enfatiza que o “Salvador Islâmica” vai além de um roteiro turístico tradicional, e é proposta educacional e formativa. A ideia é que essa história chegue às escolas públicas e seja reconhecida como parte fundamental do contexto afro-brasileiro. A recepção ao projeto tem sido positiva, atraindo tanto turistas quanto moradores da cidade que buscam uma conexão mais profunda com a história de Salvador. A equipe do Odu Imersão Cultural, responsável pela iniciativa, já busca parcerias com instituições de ensino e agências de turismo para expandir o alcance do roteiro.

Fotos: Divulgação
Fonte: Assessoria de Comunicação